Santo Angelo, 29 de agosto, 1871
Queridos pais e irmãos.
No domingo passado recebi a querida carta de Marie e fiquei encantada com as boas notícias. Estou muito contente que a Mamãe vai bem, o que deve parecer como um milagre para ela, e todos nossos corações se juntam em gratidão ao bom Senhor que nos permite gozar de nossos pais por tanto tempo. Às vezes eu penso que tudo deveria ficar como está e todos estariam aí quando visitarmos o velho continente outra vez. Meu querido marido viajou ontem à Porto Alegre e São Leopoldo para visitar e consultar os pastores acerca de transferir-nos a outra comunidade. Ele deveria ter levado esta carta mas tive tanto que fazer para a sua viagem que não me deu tempo. Também pensei que seria melhor esperar com esta carta para incluir qualquer informação de nossa mudança. Como hoje é domingo e não sei como passar o tempo vou escrever cartas. Aqui é como Hellsber, é um milagre se alguém passa por aqui. Eu pedi a Lisette que ficasse comigo, ela tinha voltado à sua casa desde junho. Ela vai ficar as duas semanas que meu marido está de viagem. Agora estamos sentadas aqui sozinhas e silenciosas, lendo e escrevendo e comendo laranjas e bebendo vinho da terra. Este tem um gosto como o de Württenberg, custa 3 a 4 coroas, mas é melhor que nada. Também temos vinho feito em casa, mas eu não gosto muito. A viagem daqui à Porto Alegre é muito perigosa e difícil, porque leva dois dias à cavalo até Rio Pardo e se tem de passar as noites ao ar livre. Friedrich, o filho de nosso vizinho, está acompanhando a Eduard e, se Deus quiser, devem chegar esta noite em Rio Pardo. Na terça-feira de manhã o vapor sai para Porto Alegre, onde chega de noite.
Aí os dois cavalos não podem ir junto e devem ser deixados em uma estrebaria onde cobram uma fortuna, sem dar garantias que os pretos não vão roubá-los. Os pretos descobriram uma maneira de fazer uma pequena fortuna. Imagina o que fazem: eles roubam os cavalos e levam a um potreiro distante onde os escondem, mas eles continuam na zona onde foram roubados. Quando os donos começam a procurar os cavalos roubados eles se oferecem para ajudar a achá-los, cobrando muito dinheiro. Uma vez que estão de acordo eles desaparecem e naturalmente “acham” os cavalos e pedem uma fortuna pelo resgate.
Nossos cavalos são grandes e fortes e bem que se sabe que se forem roubados os ladrões preferirão ficar com eles. A situação em nossa comunidade é muito triste, os membros são pessoas muito maldosas. Tu sabes que meu esposo queria sair no ano passado, mas o presidente da comunidade rogou que continuasse com esta paróquia e outra em cima das montanhas e assim ficamos. O ano passado ele tinha três paróquias e vivia na mais estabelecida, mas passava o dia à cavalo, especialmente, servindo como mediador de brigas. Assim esta comunidade, maior que as outras três, pediu-lhe que ficasse como seu pastor com o mesmo salário que as outras três juntas; como ele não sabia o que fazer aceitou a oferta, pois, era menos trabalho. No começo tudo foi bem e, então, as brigas começaram também aqui.
20 de outubro
Somente hoje posso continuar minha carta e escrevo de São Leopoldo onde estou já a 3 semanas. Estamos morando com o pastor Wegel que vivia na África. Quando eu comecei minha carta faziam 8 dias que Eduard havia partido. Enquanto ele estava longe eu festejei o meu aniversário sozinha e sabia em meus pensamentos que Mamãe estava pensando em mim. Quando despertei pela manhã as meninas haviam decorado a mesa do café com uma coroa de flores frescas e um cartão de aniversário escrito por meu marido antes de viajar e que ele havia dado às meninas para dar-me no dia. Este cartão me deu tanta alegria como se eu tivesse recebido o melhor presente. Enquanto eu estava sentada à mesa, calculando o tempo que ele levaria para voltar, vem ele cavalgando todo contente! Os pastores lhe haviam aconselhado a deixar este lugar imediatamente e voltar à São Leopoldo, porque havia muitas vagas na vizinhança. Falando a verdade, sair com esta pressa não era recomendável, pois, nós havíamos terminado de fazer um grande estoque de conservas, etc. que nos iriam durar por muito tempo. Mas se perdessemos esta oportunidade, então, levaria muito tempo antes que outra oferta boa surgisse e assim seguimos o conselho dos pastores, vendemos tudo o que foi possível, e naturalmente, pela metade do valor, e nos preparamos para a longa viagem. Eu matei todos os gansos para ficar com a penas, vendemos os porcos e as galinhas e também um cavalo e todos os móveis, mesas, cadeiras, etc. A comunidade estava muito surpresa em ver-nos partir, pois, sempre nos haviam tratado amavelmente: isto é, levou todo o inverno para eles acharem dinheiro e pagarem nosso salário, deixaram que morássemos em uma cabana com paredes cheias de frestas, onde soprava o vento com tanta força que quase voávamos fora da cama, onde a chuva entrava pelo telhado furado como uma goteira incessante: bem que eles podiam ter terminado a casa, nem precisavam de dinheiro para isto só um pouco de boa vontade e mão de obra.
Se tens saúde como eu, graças a Deus, então não é um problema tão grande, mas para o Eduard, vivendo nesta umidade constante trouxe muitos problemas, especialmente durante o inverno. Fazia muito frio e três vezes nevou tanto que as crianças puderam atirar bolas de neve. Nunca imaginei que fizesse tanto frio no Brasil, eu não conseguia esquentar-me. O frio durou muito tempo, de maio até agora, geada todas as noites e um vento gelado todos os dias. De vez em quando tínhamos dias quentes que causavam sofrimento maior quando o frio voltava. Era difícil trabalhar e os dedos congelados dificultavam costurar e escrever. Não pudemos botar um fogão neste quarto, apesar de termos comprado um grande e por isto não tens tido notícias nossas. Mas mesmo assim, eu me acostumei a este lugar. Tudo é tão quieto e sossegado e tínhamos um jardim e uma horta onde plantei uma couve muito bonita e beterrabas e outras verduras como cebolas, cenouras, alface, etc. Também tínhamos um pomar e muitas galinhas e pintinhos, os gansos botavam muitos ovos e eu estava antecipando ver os gansinhos nadando no nosso riacho.
Infelizmente, não havia outra solução, esta comunidade não iria melhorar, eles são malvados e brigões e queriam que o seu pastor fizesse o que eles queriam, o que ele não tolerava: eles então não pagavam o seu salário e também não faziam outros favores. Alguns ficaram violentos, especialmente, os mais mandões e queriam causar problemas quando saímos, mas perderam a coragem e nos deixaram partir. No dia 23 de setembro fomos até a casa de um fazendeiro, um suíço, o qual, era um dos membros mais simpáticos da comunidade. Pernoitamos aí e nos trataram com muita amabilidade e o seu filho nos acompanhou no resto da viagem.
No dia seguinte o carroceiro chegou com o resto de nossa mudança e continuamos pelo campo, pernoitando de novo ao ar livre, sob a proteção do Senhor. Deixamos os fogos acesos toda a noite para esquentar-nos. Depois de mais dois dias de viagem chegamos `a Cachoeira, onde iríamos embarcar, mas chegamos cedo. Passamos dois dias com o Barão von Kahlden, o nosso diretor, e na segunda-feira nos foi possível embarcar com toda a nossa mudança, o nosso cavalo e o nosso cachorrinho que não queríamos abandonar. Depois de seis dias chegamos aqui e recebemos cordiais boas-vindas do Pastor Wegel, com o qual vamos morar por algumas semanas até se decidir onde estabelecer residência permanente.
Meu marido poderia ter escolhido qualquer paróquia, mas ele preferiu trabalhar com estes pastores que se uniram para fundar um sínodo e querem que este se torne uma realidade. Outra razão para ficar aqui mais tempo é a minha condição, pois, estou para dar a luz ao nosso primeiro filho dentro de umas duas semanas. Isto também, em parte, é a razão pela qual nos mudamos, pois, na selva não há médico nem parteira e queríamos ter ajuda caso houvesse problemas.
Mamãe vai ficar surpresa com a rapidez com que tudo ocorre aqui, o mesmo que ela disse de Kath - todos sabem como o Brasil é fértil, especialmente, quanto às crianças. Eu queria escrever mais, mas o correio está por sair e eu queria escrever a Barmen e também a Babette e Bertha, mas vou escrever a elas quando tenho notícias da nova posição de Eduard. Estou preocupada por termos de ficar aqui tanto tempo, pois, considerando minhas circunstâncias preferiria estar em minha própria casa, apesar da amabilidade dos Wegels, mas se Deus é misericordioso tudo irá bem e poderemos sair em breve. Meu querido Eduard está lecionando para umas 60 crianças e eu tenho muito que costurar.
Como são tristes as notícias de Marie que o noivo faleceu, o jovem e rico Isenschmidt, é verdade, quando chega a morte não há ervas nem dinheiro que proteja.
Deve ter sido um duro golpe ao Jacob que agora deve achar outro. Que fará agora a pobre Sra. Geigenberger? Isto foram sinais do Senhor para por a casa em ordem, não se sabe nunca quando somos chamados.
A pobre Mamãe deve estar muito preocupada, mas não deve ser assim, pois, aqui temos tudo como na Alemanha ou até mais e se há sofrimento, isto é parte da vida. Neste momento estamos gozando de uma maravilhosa primavera, é difícil crer que em breve será Natal, quando aproveitamos este tempo com mais sabor, pois, sabemos que vocês estão sofrendo no frio. Tudo aqui floresce ao mesmo tempo.
As cercas estão cobertas com rosas trepadeiras e os arbustos estão em flor quando damos nossos passeios, tudo selvagem e na Alemanha só cresceriam depois de cultivo cuidadoso. As laranjas estão maduras e eu como tantas quanto quero todos os dias. Os Wegels tem muitas árvores em seu pomar e, imagina querida Mãe, comemos feijão preto duas vezes por semana com carne de porco e laranjas, tudo cozinhado junto, também o arroz é cozido com laranjas e o sabor é delicioso. Tu deves vir visitar-nos quando estamos estabelecidos outra vez para poder comer laranjas à vontade! Em breve os pêssegos vão estar maduros, as uvas, os melões, melancias e figos, os quais, vou secar e fazer passas, especialmente, gosto de passa de pêssego.
Recentemente tivemos notícias do Inspetor Fabris de que o seu filho mais moço, Friedrich, faleceu. Ele só tinha sete anos e era tão querido, eu gostava muito dele e muitas vezes ele sentou-se no meu colo. Notícias como estas não são muito boas para mim na minha condição, mas Mamãe não deve preocupar-se. Eu consultei ao médico e ele acha que tudo irá bem comigo e também, Mamãe, o que eu escrevi da última comunidade, não era tão horrível, nossas vidas nunca foram ameaçadas - eu acho que era um sinal de depressão causado pelo inverno. E como vais? A saúde de Mamãe continua melhorando? Como está Gern? Soube que tiveram um filhinho. O meu irmão Fritz continua solteiro e o que houve entre ele e Lina? Ele não queria casar-se? Eu lhe mando lembranças e que me escreva. Tiveram um bom ano em Hellsberg? Sem granizo? Papai deve estar muito feliz de encontrar-se em sua casa própria. Eu acho que esta carta só vai chegar lá pelo Natal e assim lhes desejo a todos um Feliz Natal. Marie não mencionou a família Himmel? Eles ainda vem visitar de vez em quando? Se alguém me manda lembranças, por favor, me escrevam, pois, até lembranças me trazem alegria. Quando Fritz responder digam-lhe que escreva para Pastor E. Falk, a/c de Pastor Kleingünther, Hochw., Porto Alegre, Província do Rio Grande do Sul, Brasil .E agora adeus e escreve em breve.
Muitas lembranças a todos de seus filhos
Johanna e Eduard Falk.
Número
CARTA # 01
Local
Petrópolis
Santo Ângelo
Santo Ângelo
Santo Ângelo
Santo Ângelo
Santa Cruz
Santa Cruz
Santa Cruz
Ferraz
Ferraz
Ferraz
Ferraz
Ferraz
Ferraz
Vila Teresa
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Conventos
Dois Irmãos
Conventos
Feliz
Feliz
Feliz
São Leopoldo
Santa Cruz
Santa Cruz
Santa Cruz
Conventos
Conventos
Feliz
Feliz
Feliz
Feliz
Feliz
Feliz
Feliz
Feliz
Feliz
Data
04/01/1871
02/03/1871
28/03/1871
25/06/1871
29/08/1871
07/07/1874
09/10/1875
07/05/1877
10/09/1877
16/06/1878
20/07/1880
06/06/1881
06/08/1881
12/08/1881
28/01/1885
05/12/1886
25/01/1891
10/09/1891
25/09/1892
24/08/1894
23/09/1894
06/01/1895
04/08/1895
01/12/1895
28/11/1896
08/08/1897
18/01/1898
26/12/1898
07/05/1899
08/07/1900
05/05/1901
10/11/1906
10/10/1871
06/05/1872
21/03/1875
21/06/1896
10/10/1898
28/12/1898
11/01/1903
27/06/1903
13/11/1903
25/02/1906
27/05/1906
15/07/1906
19/07/1906
14/11/1912
10/07/1917
Remetente
Johanna F.F
Johanna F.F
Johanna e Eduard F.
Johanna F.F
Johanna e Eduard F.
Johanna e Eduard F.
Johanna F.F
Johanna F.F
Johanna F.F
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Heinrich Eduard F
Johanna F.F
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Heinrich Eduard F
Heinrich Eduard F
Heinrich Eduard F
Heinrich Eduard F
Heinrich Eduard F
Heinrich Eduard F
Heinrich Eduard F
Johanna F.F
Johanna F.F
Johanna e Eduard F.
Johanna F.F
Johanna F.F
Johanna F.F
Johanna F.F
Heinrich Eduard F
Heinrich Eduard F
Destinatário
Irmã Marie
Pais
Cunhada Tereza
Sobrinha Emma
Irmão Fritz
Irmão Fritz
Sobrinha Emma
Sobrinha Emma
Sobrinha Emma
Sobrinha Emma
Sobrinha Emma
Pastor Hunsche
Madame Abel
Frederico
Futura Nora
Neto Rudi
Frederico