LIVRO HISTÓRICO DA FAMILIA FALK NO BRASIL
Por Osmar Falk
Ano 2023
PREFÁCIO
Quero começar este relato histórico lembrando um fato que ouvi recentemente. Um menino observava encantado seu avô usando uma máquina de escrever. Admirado o neto disse: “Puxa vida, vovô, esta máquina tem a impressora embutida; ela escreve e imprime ao mesmo tempo”. A máquina de escrever, como muitas outras coisas, pertencem ao passado. E as coisas do passado, por muitos, são vistas com somenos importância. Este neto soube valorizar um objeto do passado.
(Palestra apresentada no Encontro de Pastores Eméritos em 30.10.2018 pelo P.em. Osmar Falk)
A palavra de Deus diz: “Lembrai-vos dos vossos guias, os quais vos pregaram a palavra de Deus; e, considerando atentamente o fim da sua vida, imitai a fé que tiveram”. Hb 13,7. Esta é a finalidade deste trabalho. Quero centrá-lo na pessoa do meu bisavô, o qual, não cheguei a conhecer pessoalmente, mas pela pesquisa conheço bem a sua vida e atuação. O seu trabalho reflete as dificuldades e desafios que muitos outros colegas, guias, contemporâneos enfrentaram num tempo em que o “veículo pastoral” era o cavalo. Não tenho a intenção de enaltecer a sua pessoa e ou outros, mas trazer-lhes algo interessante, compartilhar com vocês algo de meus antepassados e resgatar fatos dos primórdios de nossa Igreja no Brasil.
SINOPSE por Osmar Falk
Através da prima Ilza Mylius Wood, residente nos Estados Unidos, obtive o livro “GERN-NEUGUINEA UND ZURÜCK”.
Ao ler o livro fiquei tão entusiasmado com a história da vida e obra do Dr. Albert Hahl que resolvi traduzi-lo para o português, com a ajuda do colega Werner Dietz, a fim de que, os demais membros de nossa família que não dominam o alemão pudessem conhecer este nosso ilustre antepassado.
Então escrevi para a autora Gerdi Kempfler e obtive autorização para publicar em nosso site a sua biografia.
Albert Hahl é sobrinho de Johanna Friederike Hahl casada com Heinrich Eduard Falk, com os quais inicia a história de nossa família no Brasil, no ano de 1871.
Durante o reinado de Guilherme II, Imperador da Alemanha e Rei da Prússia entre 1888 até 1918, a Alemanha tinha possessões ultramarinas no Oceano Pacífico, na Nova Guiné e no Arquipélago de Bismarck.
Albert Hahl foi convocado pelo Imperador como administrador destas colônias. Ele doutorou-se em Direito pela Universidade de Würzburg – Alemanha.
Também tinha formação militar sendo tenente e depois capitão imperial. Era poliglota e falava alemão, inglês, francês, latim, pidgin e 5 dialetos nativos da Nova Guiné.
Iniciou a sua carreira como assessor do governo da Franconia Superior em Bayreuth. Candidatou-se para o Serviço Colonial Imperial e aceito foi convocado para o Departamento Exterior das Colônias.
Em princípios de 1896, com apenas 28 anos de idade, foi designado pelo Imperador como Juiz Imperial da Nova Guiné.
Poucos anos depois foi designado Vice-Governador e em 10.11.1902 foi empossado Governador do Protetorado da Nova Guiné Alemã, cargo que exerceu até 1914.
Nunca mais voltou a estas colônias, porque em consequência do Tratado de Versalhes que selou a 1a Guerra Mundial a Alemanha perdeu todas as suas possessões ultramarinas.
Depois de 3 anos no Protetorado tirou as suas primeiras férias na Alemanha. Neste período casou-se com Luise von Seckendorf. Neste casamento alguns fatos chamam atenção.
Ele só conheceu a sua futura esposa neste curto período de férias, sendo que o casamento foi arranjado pelas mães.
Devido à premência de sua volta, para desgosto das mães, o casamento teve lugar a caminho. Quanta coragem de parte de Luise seguir um homem desconhecido para viver com ele numa terra inóspita e tão distante.
Para compensar tudo isso a lua de mel teve lugar a bordo do vapor que os conduziu para a Nova Guiné, numa viagem com a duração de dois meses e meio.
A administração colonial do Império está intimamente ligada a pessoa de Albert Hahl que deixou a sua marca pessoal na Nova Guiné.
Ele foi enviado para uma terra em que os nativos ainda viviam na idade da pedra, tinham costumes estranhos e praticavam o canibalismo.
Ele enfrentou muitas dificuldades neste trabalho pioneiro em que teve que lidar com a desordem do vasto território e com o atraso cultural e econômico dos aborígenes.
Para estabelecer a justiça e a ordem, baseadas na civilização ocidental, ele tinha que conquistar os nativos, especialmente, os chefes. E isso não foi fácil.
O livro de Gerdi Kempfler aborda estas dificuldades com fatos bem marcantes.
Certa vez um líder tribal lhe disse: “As tuas palavras podem servir para os brancos – a mim não me interessa. Nós, porém, queremos abater o inimigo e comê-lo; este é o nosso jeito de proceder e com este eu fico”.
O “jeito de proceder” dos nativos fazia com que sempre estivessem em pé de guerra.
O dinheiro dos nativos, em forma de conchas, servia, principalmente, para fins sagrados, mas também para comprar uma noiva e para distribuí-lo entre os parentes por ocasião da morte de um familiar.
De resto praticavam o escambo. As noivas, antes do casamento, eram isoladas por até 20 meses num cesto-cabana e engordadas pelos pais para ficarem rechonchudas e de pele desbotada, o que lhes conferia mais valor e beleza.
Era comum o assalto a outras aldeias para sequestrar pessoas para o tráfico humano e para obter carne como alimento.
Os mais fortes, para não fugirem, tinham quebradas as canelas e quando bem nutridos eram mortos e comidos.
A Missão de Neuendettelsau foi assaltada durante o culto e os homens foram mortos e as crianças e mulheres sequestradas.
Em 1904 o padre Rascher, o primeiro apóstolo dos nativos, foi assassinado juntamente com 4 missionários e 5 irmãs de caridade.
Estas mortes foram uma vingança de um chefe tribal, porque o padre se opusera a seu relacionamento amoroso com uma outra mulher da aldeia.
O próprio Albert Hahl também recebeu ameaças de morte por haver proibido o tráfico humano e baixado outras medidas que desagradaram os chefes tribais.
Certa vez um deles lhe enviou um bonito cordão trançado que continha 9 nós o que significava que em 9 dias ele iria matá-lo e comê-lo.
No Protetorado o juiz e governador Hahl recebeu algumas visitas importantes. Por volta de 1900 recebeu a visita de Robert Koch, o descobridor do bacilo de Koch, da tuberculose.
Ele estava em viagem de pesquisa para a África, Índia e o Pacífico Sul. Em fins de 1913 esteve no Protetorado o importante pintor alemão Emil Nolde.
Ele retratou a natureza e os nativos sob risco de vida. Ele não sabia que os nativos acreditavam que no momento em que alguém possuía alguma coisa do outro, que fosse apenas um fio de cabelo ou, como neste caso o retrato, podia fazer com ele o que quisesse.
Albert Hahl retornou à Alemanha no início da 1a Guerra Mundial, em 1914, onde logo se apresentou como capitão do seu Regimento.
O governo imperial, porém, se lembrou dele como pessoa altamente qualificada e o enviou para a aliada Turquia.
Lá ele exerceu até o fim da guerra, em 1918, a função de Subsecretário de Estado do Ministério da Agricultura à serviço do Sultão. Em agosto de 1918 ele se aposentou.
Depois da morte de sua esposa, em 1935, mudou-se para Gern no abrigo da casa de seu irmão.
Sob o cuidado das suas filhas Berta e Carola que nasceram na Nova Guiné sobreviveu à 2a Guerra Mundial e à rendição.
Morreu no dia de Natal de 1945 e foi sepultado no cemitério de São Sebastião em Gern.
Fritz Kempfler, marido da autora do livro em referência, era sobrinho de Hahl e assim se expressou sobre o tio ilustre: “Albert Hahl era o ídolo de nossa família, embora naquela época ainda não tivéssemos aquilatado a magnitude da sua personalidade, a extensão de suas realizações e a sua carreira extraordinária”.